segunda-feira, 10 de março de 2014

Cartas entre Aiko e Kiyomi

Querida Kiyomi,

Espero que estejas bem e que esta carta te encontre com melhor saúde. A medicação ter-te-á feito bem e os ares da montanha também, assim o desejo profundamente.

Por cá, os dias estão um pouco mais longos mas ainda demasiado cinzentos. Este fim-de-semana não saí. Nem sequer no sábado de manhã, ao Parque. Os corvos nem notarão a minha falta.

Ontem ouvi a vizinha velha nas escadas de conversa com a de cima. O mesmo falatório de sempre sobre o barulho dos cães que ladram, sobre o preço da consulta do veterinário do gato, sobre uma tal de Akemi que se separou por um amante, sobre a empregada que não veio por doença, e que ela diz ser por preguiça. Estou sem paciência. Aumento os violinos no gira-discos. Elas aperceberam-se disso. Insultaram-me de malcriado. Aumentei ainda mais os violinos.

Esta semana o Tadashi convidou-me para a festa de Primavera que vai realizar-se no fim deste mês de Março. Não lhe dei a certeza se irei. Não sei se a saudade de ti, nessa data, vai permitir-me contactar com pessoas. Hei-de escrever-lhe um postal, caso não vá.

Tenho andado para comprar um par de sapatos novos para estrear quando voltarmos ao teatro, como te prometi. Vi uns castanhos mas não gostei deles o suficiente para os comprar. Achas que o bico quadrado ainda se usa?

Fala-me de ti, minha Rainha. Como está essa tua pele aveludada com estes frios? E os teus cabelos, ao que cheiram nas montanhas? Sinto a falta do mel dos teus lábios.

A saudade já não se chama saudade. A saudade já tem o teu nome, minha doce Kiyomi.

Despeço-me teu, mais hoje que ontem,

Aiko

In the mood for love

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