sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A écharpe do bazar

Na plataforma da despedida já chamavam os últimos passageiros para o embarque. Passos apressados de um lado para o outro, cigarros fumados nervosamente e à pressa, uma criança a chorar, atirando-se para o chão. A chuva batia nos vidros com violência. “Que frio. Ainda bem que tomei aquele café quente”.

Levava o bilhete e o passaporte na mão. Mexia no telemóvel como se estivesse à espera que lhe entrasse uma última mensagem antes de o desligar. “Desligo só quando estiver sentado lá dentro”.
- Boarding pass, please!
Mostrou os documentos. Tinha pela frente onze horas de viagem.

Ouviria música, veria alguns filmes originais sem legendas, leria algumas páginas do livro antes de tombar o pescoço, adormecido.
Encolhido no estreito banco da classe económica voltou a mexer no telefone. “Então, não diz nada? Nem um ‘boa viagem’, nem nada?…”

Ela estava no escritório. Sabia que àquela hora ele estava prestes a descolar. Se tudo corresse bem só voltaria a vê-lo daí a algumas semanas. Não se tinham despedido. Aliás, pouco falaram por estes dias. Torcia para que tudo corresse bem. A Índia é um país de enormes contrastes. Viria mais magro, talvez diferente. O telemóvel vibrou. “Será dele?” Não era. Apagou a mensagem quase sem a ler. Era uma publicidade de descontos de um supermercado. Atirou o telefone para cima da secretária.

Ele apertou o cinto de segurança. Puxou as costas do banco para a frente. Olhou uma última vez o visor. Desligou o telefone.

Ela queria ter ido ao aeroporto. Dar-lhe um beijo.
Ele também queria que ela tivesse ido. Dar-lhe um abraço.
- Vens?
- Voltas?

O avião descolou. Ela olhou para o relógio. Ele respirou fundo. Não se despediram.

As viagens, mesmo as de longo curso, não apagam os lugares de partida. Nem alteram os destinos à chegada.

Traz-me um beijo com especiarias. E uma écharpe de seda. 








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